segunda-feira, 23 de julho de 2007

tarlei melo - A lógica dos prédios

Qual é a lógica dos prédios?

Serpente que não volteia. Estica-se, como que para alcançar alguma invenção fugidia; outra idéia de humanos. Estica-se e faz sombra, e, lá pelo décimo primeiro andar, volta a sobrar – e pode até derrubar avião.

O homem gosta de se fazer de ocupado; dizer que a comida é pouca e que já não tem mais lugar para plantar; dizer que a água vai acabar; dizer que não tem mais espaço mais para morar. Assim viver é difícil, e vamos construir outro edifício. Botamos as mãos à obra, com alguma massa e muito cimento, e, em São Paulo, com muitos migrantes nordestinos, o homem se estica pro céu.

O prédio é o homem de cabeça erguida, em cima de muito pescoço. É um jeito de olhar para o céu e dizer que, com tanto pecado, ainda encara Deus de frente, e que pode, qualquer dia, sentar ao seu lado, se tiver cimento suficiente. Mas este “lado-a-lado” com Deus, custa: custa os homens amontoados; custa os homens uns sobres os outros; custa essa montanha de explorados, todos empilhados. Não é jeito de morar mais: um ao lado do outro. Inventamos as colunas, e agora ninguém mais segura o homem no chão.

Sinalizamos o topo, pois há homens alados. E há ainda homens mais que alados, que querem pisar em Marte, e querem morar por lá, a Terra já não basta como casa. Inventamos as asas, e não há mais lugar para se esconder nesse firmamento. Cada vez mais alto é o que pretendemos, cada vez mais entramos no Reinos dos Céus; se Deus estivesse lá, já O teríamos visto, pois o céu está muito freqüentado agora. Enfiamos a cabeça no sótão onde Ele morava, olhamos para um lado e para o outro e não vimos nada. Desde quando será que já não morava ali?

Ainda não encontrei a lógica dos prédios, porque talvez não haja. Pelo menos não para um caipira que mora em Franca, que vê um terreno vago ao lado do seu toda vez que sai de casa. Talvez ainda tenha muito espaço no mundo afinal. Mas desde o gótico, o teto das casas dos homens tem subido cada vez mais. E agora que o homem inventou a coluna, ele tem que usar. E nem vai adiantar reclamar, ninguém detém o progresso em sua marcha. E no final das contas, quando se vai visitar, é até coisa bonita de se ver: essa gente em conserva guardada em armários.
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- em resposta ao texto de Psicho Pato, em seu blog, http://bolotosco.blogspot.com/search/label/escambo

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